19 junho 2013

O Internacional

Algo explode no Brasil
Não sei bem o que
Um imenso big bang que pode voltar ao nada
Talvez seja eu agora
Com o perdão da comparação
Um sentimento de Adorno
Vendo 68 em Maio
Sem tirar os pés da universidade
Talvez seja eu  uma espécie de velho de alma
Um  cético
Sempre a esperar
E  quando o dia chega decide que não é aquele
Porque prefere esperar


E nesse sentido
Talvez seja eu
Só eu
Desconfiado, taciturno
Preconceituoso
Talvez,
Seja meu desgosto com a Classe Média
Esse nome que é sinônimo da besta para a esquerda
Que esquerda? Dizer que não há esquerda já é ser da Classe
E eu aprendi, que ela existe, mesmo que a  tentem calar
Ela é o trabalhador, independente de partido, o trabalhador é sempre o mesmo
Por todos os lados a Classe espreita esse anseio de liberdade
Ora, a mente do trabalhador é o pânico do sistema
Talvez seja eu mais um adepto dessa teoria da conspiração
Esse absurdo considerando que o mundo evolui em cada dia
E dentro de dez anos seremos todos felizes

A Classe, a feliz Classe que não é a operária
Que se mostra nos ufanismos exagerados dos cartazes
Em uma luta que vem conseguindo pulverizar
Em busca de inimigos intangíveis, a tão criticada "corrupção"
Mas eu estou errado
Temos de aceita-los
Nós temos não é mesmo?
A luta também é deles
Do "gigante que acordou"
Deles que corrompem nossos sonhos
Estigmatizam nossos cabelos
Colocam de lado nossa música
Temos de aceitá-los!!

Melhor é não perguntarmos se algo mudou com a nova onda
Das revoltas de branco, de paz
Paz sem luta?
A mídia volta a tornar-se amiga
A voz do machismo se propaga em uma certa folha de um certo São Paulo
Criticam o sai da miséria e vá comer algo
Porque pobre tem que trabalhar não é mesmo?
Sem trabalho não tem pão
Ora, mas e você filho da classe, já trabalhou?
Mudar a polícia? Não, ela volta a ser amiga
Sentamos todos juntos um dia, e a luta não é contra polícia
Agora ela faz parte do povo e teve seus pecados redimidos
A luta agora é outra
Uma imensa revolta contra tudo, que não se propõe autocriticar
Antes dizer - que o movimento é de todos
Contra o que? contra todos?
Quem são "todos"?
Não! Isso não, porque não queremos mudar o Brazilian Way of Life
Não, isso é démodé, somos todos injustiçados agora
E não me venha nenhum cafona se auto intitular oprimido
Somos todos agora um só
O gigante!

De novo, de novo o violentado verá seu espaço ser tomado
Contra uma tal violência sem direção
O porque do branco nas roupas, esse violentado que nunca violentou
Hoje terá de usar branco para ir as ruas?
Antes não seria vermelho da luta? Ou preto do luto? Da raiva, da revolta?
Esse que se pretende internacional e nem sabia,
Esse que não canta hino
Não por não gostar de seu país, não é isso, mas talvez ele esteja mais ligado em ser humano
Pelo que eles tem de comum
Essa opressão que é a mesma, independente da bandeira
Essas mãos que são as mesmas e sustentam as nações
Homens que vivem a margem do Estado

É, talvez o violentado, o oprimido, ou seja lá qual nome queiram lhe dar
O Comunista, o baderneiro, o povão, porque povo é uma coisa, povão é outra
Talvez esse individuo em todas as lutas posteriores não tenha se pintado
Verde e amarelo pra que?
Não tenha cantado o hino
Ele não sabe o hino, e porque saberia?
Talvez esse homem se pretenda internacional
Ou se pretenda apenas humano, apenas oprimido
Em uma luta que ele sabe bem qual é!

15 junho 2013

A SEGURANÇA MANTIDA


Sobre Polícia e Democracia.


   Vinte e cinco anos da Constituição de 1988 e muitas mudanças desde então. Cresci com a democracia representativa no Brasil, nasci em 1989, no ano da queda do muro de Berlim, uma época em que se via o Comunismo dar seus últimos suspiros na União Soviética ao mesmo tempo em que a ordem democrática ia sendo restituída em várias nações. Desde então grande parte do globo vive o sistema da democracia representativa - cada nação com suas peculiaridades, é claro.


   Acredito que no Brasil o sistema representativo esteja caminhando bem apesar dos percalços que toda democracia enfrenta principalmente no inicio. Não penso que seja o momento de uma nova constituição como defendido por alguns “federalistas” e outros. Ao meu ver a ideia de uma nova carta, em si é pouco democrática. Constituições devem nascer no seio de transformações sociais de vulto, quando já não é possível o recurso a outros meios, um povo precisa de segurança jurídica para se desenvolver, sem temer que da noite para o dia seus direitos sejam modificados por uma nova Lei Fundamental.

  Entretanto, se não é o momento para uma nova constituição, é passado o momento para algumas reformas que repercutirão na democracia em nosso país. As leis não existem para ficarem apenas no papel, elas vem ao mundo como anseio de uma nova realidade, ou adaptação de uma situação já existente. Uma nova lei está vinculada a ideia de mudança, e muito mais importante do que ter a lei, é o acolhimento e respeito que ela angaria nos seus destinatários, o povo. Resumindo, uma constituição pode até ser democrática em seus preceitos, mas a democracia só chega a nós no momento em que esses valores são transmitidos e realizados.

   É tempo de fazer valer os preceitos constitucionais, e isso é tarefa de todos (clichê, porém importante). Cada um em sua área pode agir de uma forma diferente auxiliando nessa tarefa, professores conscientizando alunos; servidores públicos prestando serviço de qualidade; nós, enquanto cidadãos, reivindicando; etc. No contexto jurídico é hora de refletirmos sobre algumas questões necessárias para a realização da democracia. 

   Antes de mais nada, queria pedir perdão por possíveis incorreções ou ofensas a qualquer classe que seja. Se o fiz não foi com intenção - embora saiba que de boas intenções o inferno está cheio - com o perdão da brincadeira, o objetivo não foi de generalizar comportamentos, foi antes tentar analisar a questão e trazer ao debate.

   Vamos então ao que interessa, a Reforma da Polícia...

   Para que possamos viver uma real democracia o povo tem que ter o direito de sair as ruas para protestar sem medo da repressão. A atuação violenta da polícia só legitima a violência dos manifestantes, retirando a autoridade e respeito que a instituição precisa para atuar. A Polícia Militar está em descredito com a população, em débito com a democracia, e não é de hoje que isso vem acontecendo. Não é preciso recorrer ao regime ditatorial para lembrar de cenas como a ocorrida em Goiânia, quando a ROTAM ficou dando voltas em torno da organização Jaime Câmara a fim de intimidar jornalistas.

   Quando nos deparamos com notícias acerca da violência policial, dentre várias reações duas me parecem as mais comuns a) pensar que a atuação realmente esta correta e que a violência é necessária para se ter paz na sociedade (o que é evidentemente um perigo e um paradoxo num regime democrático, se é preciso reprimir o próprio povo e inobservar preceitos legais, regressamos à ditadura); b) acreditar que o Estado não nos representa, pois reprime o cidadão, e isso deslegitima o sistema democrático sendo apenas um passo para acreditarmos – erroneamente – que toda a polícia é ignorante, por não compreender os direitos dos cidadãos e ao mesmo tempo defender políticas corruptas e desumanas.

   Mas a questão é um pouco mais complexa do que um simples maniqueísmo de policial bom ou mau, está para além do indivíduo. Mas e então, a culpa é de quem mais!? Da própria organização da polícia, da forma como ela é pensada. Se os agentes são violentos não é à toa, quando se recebe um treinamento militar o indivíduo deixa de ser civil e passa a ser um soldado, e isso não quer dizer pouca coisa, militares tem estatutos diferentes, incorrem em crimes diferentes, não tendo as mesmas prerrogativas de um servidor público civil.

   Também não podemos esquecer que os policiais trabalham com o que existe de pior na sociedade, o que pode ocasionar danos emocionais irreversíveis, convivem com situações que deixaria sem sono a maioria dos civis. Esses homens são postos nas ruas sem apoio psicológico de qualidade, não passam por avaliações frequentes, e acabam muitas vezes sendo incitados por políticos, jornalistas e outros setores da sociedade a uma atuação violenta. É alguma surpresa o resultado catastrófico dessa equação?

Jornalista baleada no olho por um policial.¹
   Em um filme, que não me lembro o nome, o personagem representado por Denzel Washington, quando informado sobre a entrada do exército em Nova York para combater terroristas, disse algo como: “Nunca colocamos militares para atuar no meio do povo. Militares são para guerras, para entrar em outros países, não no nosso próprio!” acho que traduz bem a questão aqui colocada. Cada um faz o que foi treinado para fazer e talvez disciplina extrema, que é necessária ao Exército pela sua própria condição, não seja a melhor forma de preparar os policiais para lidar com civis. Aliás, a própria frase “Policia Militar para lidar com civis” é uma contradição em termos, militares e civis não devem compartilhar nem mesmo a frase.

   Ser militar é ser disciplinado, organizado, treinado, doutrinado para defender o Estado, seja o inimigo um infrator, terrorista ou um manifestante. Militar cumpre ordens, pois mesmo que se saiba que portar vinagre não é motivo para prender ninguém, acabam por ter de realizar operações sem sentido.

   Em suma, militares e manifestantes não combinam.

   Então pergunto de novo, o que fazer!? O que precisa mudar, dentre outras coisas, é o treinamento, deixando de ser militar e passando a ser civil. Afinal a polícia lida com cidadãos comuns, está em contato direto com a sociedade, esse organismo tão complexo que se mostra em diferentes facetas, passando de tentativa de suicídio a troca de tiros com bandidos. O problema é que cada situação necessita um agir diferente, e é preciso estar preparado para isso, preparação que ao meu ver se mostra incongruente com um regime de trabalho autoritário como o militar, o policial para proteger o civil precisa ser também civil.

   Não temos que admitir sermos violentados por agentes públicos que deveriam nos proteger, foi como uma piada de mau gosto ouvir o relato de manifestantes que precisaram entrar em um prédio da UFG para “fugir” da polícia. Isso é absurdo, ter medo da polícia é absurdo.Quase todos nós já fomos vítimas de abordagens violentas, mesmo quando se pede socorro a polícia ela costuma ser grosseira e pouco receptiva, e isso eu não precisei ver em jornais e revistas ou ouvir relatos, é sabido de todos porque infelizmente é a nossa realidade. 

   É preciso mudar urgentemente a forma como a polícia é pensada em nosso país, o Conselho de Direitos Humanos da ONU sugeriu a extinção da polícia militar no Brasi¹. O problema, é claro, não pode passar pela simples mudança do nome dado a polícia, toda a atuação, organização e estrutura policial necessitam ser repensados – não apenas a PM. Algumas ideias podem ser adotadas como: a figura do juiz de instrução ao invés do delegado; integrar o trabalho das diferentes polícias; criar um órgão de polícia para o judiciário e MP permitindo que juízes e promotores possam atuar sem medo de serem assassinados - muitas vezes pela própria PM ou Polícia Civil etc.

   Trata-se de uma questão que não se circunscreve a um problema pontual, diz respeito a toda uma concepção de democracia sendo jogada no lixo. No Brasil hoje se tortura mais do que no regime militar, o medo de protestar continua, os organizadores das manifestações continuam a ser perseguidos e monitorados. É um total absurdo, precisamos superar esses resquícios do regime antidemocrático para podermos prosseguir na busca de um país mais justo.

   Quando achei que talvez tivesse sendo exagerado em meu texto, li na Folha de São Paulo o que Vladimir Safatle escreveu, e o nome é “Pela extinção da PM”.²

   O título foi inspirado no conto “A segurança mantida”, que está no livro O Leopardo é Um Animal Delicado, de Marina Colasanti³, e vale a pena ser lido, representa com primor a questão aqui debatida.

¹
²
³ 

02 junho 2013

Esse cansaço que grita.













Sabem quando o estômago fica embrulhado só de ler algo absurdo? De escutar besteira? De ver barbaridades sendo cometidas a torto e a direito? Pois é, acho que todos já passamos por isso, por variados motivos evidentemente, visto que cada um tem sua concepção de barbárie e um estômago diferente.

A questão é que estou ficando cansado. Cansado de deixar pra lá, de fingir que não vi e me omitir – a omissão consome tudo de bom que pode haver. Mas acompanhando as notícias sobre as manifestações em Goiânia uma alegria me veio, um respiro, um alívio. Li em algum lugar que a cidade acordou depois de mil anos e me sinto exatamente assim, feliz por ver o sol começando a nascer em Goiânia.
Vamos acordando aos poucos, mais por um cansaço, uma dor, uma vergonha, um sentimento de humilhação do que por qualquer coisa concreta. Começamos a não tolerar mais sermos tratados como um grande e imenso nada, um grande e imenso coisíssima nenhuma, começamos a nos sentir cidadãos, a nos sentirmos gente, e isso vai aliviando aos poucos a dor.
Essa coisa que não é concreta poderia ser percebida facilmente em um problema com os ônibus que são péssimos, na polícia assassina, nos presídios, no preconceito e todas essas coisas abissais com que as pessoas convivem no dia a dia, e na verdade são bem concretas! Mas não, não manifestamos apenas por qualquer interesse concreto, objetivo, de resolver isso ou aquilo.
As coisas não são assim como tentam nos convencer que é... “vai ser feito um estudo pra ver se o ônibus é mesmo lotado”ou “ahh, estão investigando os grupos de extermínio” ou ainda “foi feita uma reunião...” pois se assim fosse, uma questão de mera lógica, de boa vontade, essa revolta não teria surgido com tamanha força, é uma questão de poder, dominação ideológica e tudo isso que logo chamarão de teoria da conspiração, mas que não passa de algo claro e evidente.
Nosso rancor vem de longe, vem de dentro, vem disso que nos torna iguais na nossa condição humana, isso de ter orgulho, de ansear pela justiça. Tentam provar o impossível, dizendo que os ônibus operam no prejuízo, que o governador nada tem a ver com o bicheiro, que coelhinho da páscoa existe, tentam ligar a manifestação pelo transporte a mera questão de preço. Não, não há como ficar calado, não há como ouvir as besteiras sobre manifestação pacífica, não existe pacifismo, nunca existiu! A violência ocorre dia a dia, somos violentados todo o tempo das piores formas que se pode imaginar, violentam nossos sonhos, violentam nossos corpos, violentam nosso tempo.
Por isso não fiquemos calados! As vezes parece o melhor a ser feito, confesso que quase aderi ao vazio. A primeira coisa que aprendi quando saí da escola pública e começei a conviver na classe média (na universidade) foi a ficar calado, que essa coisa toda de reclamar sobre direitos era meio cafona, coisa de comunista, de gente esquisita, e que para entrar na classe e portanto pertencer ao grupo o melhor seria se alienar um pouco e não falar de assuntos “chatos”.
Resolvi ser chato, (já no inicio do segundo curso, um pouco tarde é verdade) resolvi ter coragem, resolvi lembrar de onde vim e enfrentar as consequências disso. É feio demais alguém que não honra sua origem.
Apoio as manifestações, apoio esse grito de desespero, porque a violência precisa parar. Não a violência contra o ônibus assegurado, contra o patrimônio que só faz gerar mais patrimônio que não é do povo nem nunca foi, a violência a qual me refiro é essa praticada pelo Estado, praticada pela mídia (sustentáculo deste). Se querem um exemplo prático - pois quem não a sente sempre achará que é exagero, que seus empregados reclamam demais etc - vou falar de um rapaz branco, economicamente de “classe média”, que poderia ser seu filho ou sua filha (ai a coisa fica séria...!), vou contar a história de alguém que para chegar na universidade pegava por dia 4 ônibus para ir (isso mesmo produção?) e 4 para voltar da faculdade. Todos cheios, 2 horas por dia no transporte público de Goiânia. Esse era eu, e o que via mais da metade dos meus colegas de sala não conseguiriam nem imaginar.
E eu ? Eu sou neném!! Tinha uma boa vida nessa época, chegava em casa, almoço na mesa, e embora perdesse esse tempo todo, ia para faculdade. E quem trabalha? Não 6h, de um estágio, não em uma mesa de escritório, mas quem põe a mão na massa, quem limpa nossa bagunça e nem imagina que seus filhos um dia irão fazer faculdade?

Isso enche o saco, para usar uma expressão chula mas que traduz bem a coisa. Enche o saco!!! Estamos de saco cheio, queremos ser vistos como gente, estão reclamando porque queimaram um ônibus, mas tomem cuidado!!! Acabem com isso logo, chamem o Exército, a Igreja, a mídia para fazer uma boa matéria sobre os perigos do “comunismo” e todos os velhos amigos, pois que um dia poderá acontecer como na Revolução Haitiana ou Russa, ou mesmo Francesa. Um dia o povo se cansa dos abusos e resolve ir fazer uma visita aos condomínios fechados. Aliás, tem ônibus que vai pra lá? (Produção responde: Sim, para levar os empregados...).