Ontem dia 13 de maio, dia da assinatura da lei que aboliu para sempre a escravidão (oficial diga se de passagem) no Brasil.
13 de maio de 1888, hoje 14 de maio de 2009 fazem 121 anos e um dia que o Brasil ia se soltando das amarras de um tempo ultrapassado, de poucas fabricas, poucos consumidores, tempo em que as diferenças entre seu próprio povo eram ainda legitimadas pelo estado, enquanto outras nações eram de fato nações e tinham orgulho de sua constituição, nós tentávamos esconder nosso passado financiando a vinda da Europa de quem quisesse vir difundir sua cultura, para que a nossa fosse então sucumbida pelos ideais do outro lado do oceano.
Cento e vinte um anos, tempo aproximadamente de três gerações, ou seja, seu bisavô ( sempre me referirei ao termo masculino pois se já era difícil a inclusão masculina na época, a feminina era quase impossível) nasceu próximo ou viveu na época da abolição.
Agora vejamos, o avô do meu pai veio ao Brasil tentar sobreviver, fugindo das dificuldades em sua terra natal, e por mais que houvesse dificuldades aqui, ele era um homem branco e assim sendo conseguiu deixar a duras penas um legado de educação para seus filhos, e as gerações seguintes se estabeleceram então com maior facilidade. Os bisavôs negros foram substituídos por esses homens brancos que nem se quer eram brasileiros, quando chegou à hora de pagar salários e só então reconhecer os serviços prestados por décadas, à aristocracia preferiu marginalizar quem era nascido aqui e trazer de fora a força de trabalho.
Menos de um século e meio, é impossível que um povo se recomponha em tão pouco tempo, sem que esforço algum fosse feito para modificar essa situação. Digam o que quiserem, o que eu vejo é que o estado tem sim uma grande divida a ser paga e não é ao FMI ou ao Banco Mundial, é ao negro Brasileiro.
Hora, se herança é passada de pai para filho, divida também, não podemos decretar essa moratória, não seria injusto para ninguém, injustiça é o que ocorre de uns poucos sendo tão beneficiados á tanto tempo, afinal há verdadeiras múmias e dinastias nas cupulas do poder, quem nunca ouviu falar da família Caiado, por exemplo? O povo que está longe da política institucional pede uma pequena parte do bolo que no entanto é sempre negada ou cocedida como se fosse esmola.
Por isso sou a favor sim das cotas em universidades públicas, e não agüento mais aquele discurso clichê, que só demonstra a pouca retórica de quem esta argumentando “ Há então você apóia as cotas porque acha que o negro é mais burro?” em primeiro lugar eu não acho nada, porque achar é coisa pra quem não tem o mínimo de certeza em suas opiniões e em segundo lugar detesto que coloquem palavras na minha boca, quando falamos de cotas não estamos falando de capacidade intelectual, e quem vai por esse caminho me assusta! As cotas são nada mais, nada menos, do que uma forma de tentar reduzir a disparidade social em que o Brasil se encontra, e de pagar essa divida histórica pela crueldade que é privar alguem do seu direito de liberdade. Já era passada a hora do estado começar com esse tipo de ação que visa a inclusão, que visa a igualdade entre as classes(ai falo das cotas em geral) basta ver a sala de um curso de medicina para se ter noção dessa situação, de quantos ali provem de uma família pobre, de quantos estudaram em escola pública.
Talvez nesse texto marcadamente opinativo em que não me preocupei em apresentar muitos dados, já que dados temos por todos os lados e opinião ainda é algo meio escasso nos meios de comunicação, eu tenha repetido muito a palavra negro, e digo que não é por mera pouca experiência que tenho em redigir textos, e sim por opção própria que utilizei a repetição. Os sinônimos que academia “inventa” como Afro-Brasileiros, por exemplo, não me agradam muito, estava tentando me lembrar quantas vezes alguém ao se referir a minha nacionalidade, ou grupo cultural, disse algo diferente de goiano ou brasileiro, e vi que isso nunca aconteceu, nunca colocaram um prefixo antes da palavra brasileiro para se referir a mim, cheguei a uma conclusão.. brancos nascidos no Brasil são brasileiros por excelência, segundo esse tipo de definição, enquanto negros nascidos no Brasil, por mais que seus antepassados já estejam aqui a 400 anos ainda carregam o prefixo Afro .
Sem falar que Afro em si é muito vago, Afro remete a África que é o segundo maior continente do mundo, o termo não carrega uma identificação cultural, apenas uma identificação territorial que é muito vaga, os livros de historia ao se referir aos imigrantes Europeus diferenciam os povos de acordo com seu local de origem e sua cultura, enquanto que, ao se referir a diáspora forçada dos africanos para as Américas, pouco se importam em mencionar de que local do continente vieram a maioria desses africanos. Não me surpreende que seja corrente o erro entre as crianças de se referir a África como sendo um único País, devido a forma homogênea em que os diferentes locais desse continente são tratados nas escolas.
Quando deixamos de combater uma injustiça, quando fechamos os olhos para os acontecimentos, quando não resgatamos nossa historia, vamos nos tornando um povo sem cultura, ate que ponto sermos taxados de povo pacífico é algo positivo? Pacífico não pode querer dizer sem luta, sem consciência, precisamos de uma memória melhor e quem sabe daqui um tempo o dia da abolição ou da consciência negra seja feriado nacional, para lembrar a luta de nosso povo e não apenas dias religiosos e independências forjadas.