05 novembro 2009

O R.U de Balzac..

Na obra ilusões perdidas de Balzac, é contada a historia de um poeta que sai do interior da França e vai tentar a vida em paris, de forma que em um momento de sua estada na cidade das luzes o poeta se torna estudante realizando pesquisas em bibliotecas e passando dia inteiro atrás dos livros. Nessa parte da historia o protagonista sobrevive com pouco dinheiro, sendo assim obrigado a adaptar-se a uma vida modesta, é ai que entra o flicouteux na narração, sendo uma espécie de RU (restaurante universitário ) parisiense tendo um papel importante na construção da oposição entre moral romântica e moral moderna tão bem relacionadas por Balzac.
O “r.u parisiense” era freqüentado por estudantes, escritores, poetas, reacionários etc, em sua grande maioria indivíduos que se opunham a ordem vigente, fosse no campo literário, político, musical, das artes plásticas, filosófico ou cientifico. Quem não fazia oposição as ideologias reinantes inseria-se com mais facilidade na sociedade francesa, tendo assim, um maior retorno tanto do ponto de vista financeiro como social, não precisando freqüentar um restaurante simples do tipo flicoteux. A imagem sempre foi tudo, e nessa época não era diferente, antes de qualquer coisa era preciso freqüentar “bons” lugares para ser aceito.
Lucianno chardon é o poeta personagem principal do livro, um iludido com a aristocracia, que almeja desde as primeiras páginas fazer parte da alta sociedade francesa. No seu momento de maior lucidez o poeta escreve um livro e vive modestamente, almoçando e jantando todos os dias no “RU” do século XIX, onde conhece quem ele descobriria ser mais tarde, seu único e verdadeiro amigo em paris.
Esse amigo de Lucianno o apresenta a um grupo de jovens intelectuais ansiosos por se tornarem elementos transformadores da França, que se encontrava em um momento de tensão, pois o país havia experimentado a maior revolução da historia mundial, calcada nos princípios de liberdade, igualdade e fraternidade e, no entanto vivia o momento da restauração, com o retorno do poder do rei e da igreja, a nobreza voltava também, assim como seus privilégios.
Não é a toa que chamo essa parte na qual Lucianno freqüenta o restaurante, de o momento mais lúcido do protagonista, a obra não se chama ilusões perdidas por acaso, o poeta, um verdadeiro interiorano se deslumbra com as dimensões de paris e com o luxo da aristocracia, deixando de lado seus ideais e até mesmo seu caráter em busca de uma vida de fama, sucesso e diversão, o seu momento RU foi sem dúvida o mais coerente e mais fundamentado.
Quando Lucianno se faz lúcido, por meio de seus amigos e da existência regrada que os custos de vida o impõem, ele parece compreender por um momento o funcionamento do estado, o real lugar de cada individuo no mantimento de uma hierarquia social injusta.
Talvez traçar um paralelo entre um restaurante citado em um livro de Balzac, que se passa no período da restauração francesa com um outro restaurante que existe hoje em Goiânia-Go seja um pouco de ousadia, mas o pensamento e a reflexão nascem da comparação e da observação.
Balzac criou personagens tão completos, com elementos psicológicos tão próximos do real que é difícil ler uma de suas obras e não identificar um sentimento ou algum modo de agir, seja em si próprio ou em algum amigo, parente ou conhecido. Se trouxermos o “RU” de Balzac para atualidade, perceberemos que nem tanta coisa mudou, sobretudo quando analisamos os freqüentadores do restaurante e suas aspirações.
No século XIX quem comia no flicouteux era geralmente quem não estava tão preocupado com a imagem e sim com um objetivo maior, uma forma de realização pessoal, uma realização plena que só vem com o esforço individual. Hoje no século XX os clientes desse “Flicoutex” remodelado, buscam em sua grande maioria concluir um curso superior, um projeto de pesquisa, enfim, formas de realização pessoais também alicerçadas na dedicação e no esforço.
Tanto em 1820 como em 2009 percebemos um comportamento semelhante entre os clientes dos restaurantes citados, são pessoas que tem uma noção (mesmo que reduzida em alguns casos) de todo, que conseguem e conseguiram enxergar a dimensão real dos acontecimentos. Essa dimensão que chamo de real é a do entendimento do quanto à sociedade seduz o cidadão a comungar de certos padrões, que na maioria das vezes são prejudiciais a si próprios.
Em outras palavras, o simples hábito de almoçar demonstra o quanto alguém é ou não influenciado, vejamos o caso da maioria dos estudantes, que vivem à custa dos pais e não são ricos: Uma boa parte vai querer almoçar em um lugar mais chique e mais caro para acompanhar um padrão, enquanto um outro grupo mais sóbrio terá noção da sua condição de estudante dependente e assim sendo terá certa parcimônia, afinal de contas não estamos em um país de ricos, e fazer uma imagem à custa de quem trabalha para sustentar seu progresso intelectual não é lá algo muito moral.
O primeiro grupo citado representa aqueles que são iludidos, os que farão de tudo para conseguir andar com o carro do ano, viverão para pagar um custo de vida desproporcional a seus ganhos, exatamente como Lucianno vai fazer no livro, antes é claro de se endividar e ter que fugir voltando de cabeça baixa pra sua cidade natal. O segundo grupo é o dos que são lúcidos, dos que conseguem enxergar longe e que com certeza gozarão da plenitude e do equilíbrio, não se juntando ao coro dos ludibriados.
Claro que o simples habito de almoçar ou não em um restaurante universitário não pode servir de base para classificar tipos comportamentais, até porque acredito que as pessoas não podem ser classificadas como fazemos com simples objetos. Quando falamos de seres humanos a generalização é sempre uma perda irreparável, mas esse simples paralelo entre os dois restaurantes muito me chamou a atenção, é impressionante um livro do século XIX descrever uma sociedade que se parece tanto com a atual em que a imagem ainda é o que há de mais importante, as revoluções parecem não ter sido suficientes para barrar o sangue azul, porém por outro lado, ainda existem os que enxergam mais a frente, muito alem de suas roupas ou do lugar em que almoçam e é perto desses que quero estar sempre.

6 comentários:

  1. Muito boa a comparação!
    Resumo da obra fez entender tuas colocações de maneira perfeita.
    Realmente a imagem serve de parâmetro para grande parte da sociedade, vejo isso em todos os âmbitos que vivo. Uma boa imagem sempre trás benefícios, mas de nada adianta se o que vir após a visão não tiver fundamentos. Gostei mesmo.

    PS: só uma correção, num ponto do texto tu pôs: como hoje no século XX - foi algo assim - faltou um século. hehehe

    Abraços!

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  2. uiahsuiahsiua
    é mesmo
    to vivendo no século xx ainda
    vaaleu demais Marco
    valeu mesmo
    texto meio grande achei que ngm fosse ler =p

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  3. hasuhasuas
    imagina, li e gostei de mais, quem não o fizer com certeza vai perder grande coisa!

    abração.

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  4. E há os que comem no RU não por "lucidez", mas pq o dinheiro que ganham é a conta para isso, ás vezes até de bolsa alimentação, e reclamam e sonham não estar ali, sonham com a "ilusão"

    pois é, a palavra revolução pode significar um movimento que sai de um ponto e retorna a esse mesmo ponto, como os planetas que possuem esse tipo de movimento, girando sobre si mesmos, retornando sempre ao mesmo ponto. Revoluções mudam algumas coisas, mas assim que as coisas se estabilizam, uma nova ordem surge. Na época do livro os valores desejados são ainda os da aristrocracia, hoje o que ocupa esse lugar são os valores da alta burguesia, a mesma que séculos antes questionou os valores aristocráticos.

    Boa a análise!

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  5. uma sugestão de blog:
    http://classemediawayoflife.blogspot.com/
    Classe Média Way of Life
    haahahauhauahuah

    bem a ver com o tema aqui
    os valores e modos de vida tão almejados!!

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