01 abril 2010

Incentivo para o lado errado

É costumeiro e marca de independência a posse do carro próprio. Já virou sonho de consumo muitas vezes posto à frente até mesmo da casa própria. Motivo de status e comodidade, o automóvel está cada vez mais acessível ao consumidor que sempre sonhou com seu ‘carrinho’. Há muito tempo, o objeto demonstrava muito mais status que atualmente, só o possuía quem tivesse um grande poder aquisitivo e com certeza não era qualquer ‘pé-rapado’ – sem ofensas, pois me incluo nessa categoria – que conseguia adquiri-lo. Sempre o mesmo papo de globalização e tudo mais é posto na mesa, mas não há como deixar esse processo de ‘evolução’ fora do deste assunto. Vimos que com o passar do tempo, a evolução do homem, da sociedade, do comércio e de tudo mais que abrange o dia-a-dia, as facilidades e condições humanas foram sendo encontradas e com muita ‘luta’ (ou não) chegamos ao ponto que estamos hoje.

É fato que o poder aquisitivo do brasileiro aumentou e a condição de trabalho também está melhor, o povo lutou pelos seus direitos e os têm como troféu que se guarda no lugar mais reservado da prateleira. Nos dias de hoje, há uma facilidade grandiosa em conseguir crédito, por exemplo, o que torna muito mais viável a compra de bens, sejam eles quais forem. Como percebido no início do texto, estou aqui para falar em um bem de aquisição específico: o automóvel. Todas as facilidades encontradas no mercado hoje incentivam o crescimento da compra e venda de carros, sejam novos ou usados e apesar de ser uma tecnologia à nosso favor, o homem está ‘viciando’ de forma não benéfica – alias, acho que vícios não podem ser benéficos. Na cidade onde resido carro não é uma necessidade de ultraurgência, embora facilite as atividades, diferente do que acontece em uma cidade grande que – como o nome já diz – pela sua grandeza, impossibilita que trajetos de certos pontos sejam feitos a pé.

Em cidades grandes ou de menor porte, o vício do carro está impregnado em todas as classes econômicas e isso pode ser considerado um dos grandes males do século – já são tantos. Em uma cidade como São Paulo, por exemplo, seria impossível atravessar a cidade a pé, o transporte público seria o melhor meio, mas nem é preciso comentar as condições de transporte em todos os lugares do Brasil, com certeza com algumas exceções, mas que desconheço. O meio mais fácil então é a compra do carro [ponto] Não há o que se discutir. A cidade pequena torna possível a caminhada, mas a comodidade que o carro trás não. Novamente a compra do carro é a melhor saída [ponto] Claro que muito do que vemos hoje nos grandes centros – e até nos pequenos, afinal minha cidade que tem pouco mais de trinta mil habitantes já está um caos – é culpa do consumidor, da população que não toma consciência de como a vida melhoraria se os carros fossem quando possível, deixados de lado.

Digo que uma parcela da culpa de tudo isso pode ser imposta a nós, mas a parcela é minúscula, afinal somos resultado da sociedade que vivemos, resultado da forma como o governo lida com nossas necessidades e por fim resultado da gana de grandes montadoras. Temos que tomar consciência de que se possível for, deixar o carro na garagem é um ato à nosso favor, porém o que poucos comentam é que o governo deve se conscientizar que incentivar a compra de automóveis da forma que o faz não é o mais correto. Apesar de muito nos beneficiar com empregos e tudo mais, nos prejudica e muito em outros aspectos. Ao contrário do que tem por papel, o governo deixa de lado transporte público – que para mim deveria de estar nas prioridades, junto com saúde e educação (segurança não é tão necessária se há uma boa educação) –, incentiva a compra desordenada de carros, abaixa imposto, facilita crédito, mas não investe em ônibus, metrô ou qualquer outro meio de transporte.

Eu sou mais um brasileiro que acha maravilhoso ter um carro, que assim que possível fará a aquisição do seu próprio, isso é fato, não estou dizendo que não deve haver incentivo de compra, que devemos desistir dos ‘sonhos’ – por mais fúteis que sejam -, mas há de ter além desse tipo de incentivo, o incentivo ao uso de transporte público, o deixando em boas condições. Quanto facilitaria o trânsito se as pessoas que passam horas presas entre carros e buzinas utilizassem de um ônibus ou de um metrô? Só vendo para saber, mas por meus pensamentos acho que muito. Países desenvolvidos normalmente possuem transporte público em ótimas condições, instigando todos a se recostarem e viajarem o invés de tirar o carro da garagem e se incomodar. Países de primeiro mundo possuem transporte e estradas boas, o que torna as coisas muito mais fáceis, afinal o transporte é primordial para o crescimento.

Em suma, o Brasil não está nem perto de uma solução para o transporte público – não que eu tenha notícias ao menos -, possui estradas em péssimas condições, sendo que pagamos altíssimos impostos na compra de carros – um carro no Brasil custa quase o dobro do preço do mesmo modelo comprado na Argentina ou México, por exemplo; sendo que possuímos fábricas de diversas montadoras em território brasileiro – e fora IPVA, pedágio e tantas outras taxas ‘escondidas’. O pior de tudo é que o incentivo a compra de carro continua e não importa se é um ‘pé-rapado’, pois com tantas condições somos capazes de sair da concessionária com um carro zero sem nem um ‘pila’ no bolso. Pessoas sem condições de manter um carro o compram, “afinal ta baratinho né?”. Não é marginalização, não é preconceito, mas é fato que uma pessoa sem condições não pode ter um carro, mas o tem, ai que vemos acidentes por falta de manutenção, falta de dinheiro pra gasolina, inadimplência e tudo mais. Fiquemos calmos, afinal não é culpa nossa; recebemos TODOS os incentivos para comprar, não temos outro meio de transporte decente, logo, compramos (mesmo que um mês depois tentamos a qualquer custo vender, pois não conseguimos pagar nem se quer a primeira parcela). Comprar, comprar, comprar, como zumbis alguns são programados e outros ainda fogem. Espero o dia que o próximo filme será lançado, já prevejo até o título: “O dia em que a terra parou II” – o motivo que não será mais o mesmo, agora o trânsito com seus carros será o protagonista, infelizmente a bilheteria não terá muito lucro, pois todos estarão presos em seus carros financiados escutando buzinas e xingamentos. Nos vemos em alguma rua qualquer.

3 comentários:

  1. Uma sociedade que prima pelo indiviadulismo enfatiza mesmo os bens "privados", ao invés dos bens públicos, o que fica evidente nessa questão do automóvel. E essa crise, que se evidencia no trânsito, é só a ponta do iceberg de como vivemos num sistema que não é sustentável.
    Eu adoro andar, se pudesse faria tudo a pé (mas pra mim é meio impossível pelas distâncias e pelo sol e calor daqui), mas acabarei tendo um carro tb um dia, mas gostaria de usá-lo o menos possível.

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  2. Com certeza é apenas a ponta o iceberg, eu tenho consciência que sou muito individualista, e todos meus pensamentos - se fosse racional - me levariam a não dar bola a esta questão, mas não tenho como fechar os olhos. Uma coisa que sempre imaginei é como seria pegar ônibus ou um metrô em boas condições, muitas vezes vejo isso em filmes, e desde sempre imaginei como seria. Infelizmente aqui no Brasil não há esse tipo de incentivo, infelizmente. Obrigado por ler o texto! Ponto negativo, não a temos mais como 'contribuinte' do blog, com teus textos, mas o ponto positivo é que ainda a temos como leitora, isso é muito importante! =D

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  3. aqui em goiania infelizmente nao tem jeito, cidade grande e tudo longe, ai pra sair a noite complica voltar pra casa, nao tenho carro mas queria ir nao tanto por mim mas pelo conforto de quem anda comigo, tipo c ta saindo com uma guria ai quer deixar ela em casa pq e perigoso e tal,mas sei que existe mesmo toda uma logica incentivando pra isso mesmo, pra lotarmos nossas estradas e nos individarmos com carros caros e novos !

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