27 agosto 2009

Se for pra proibir, que o faça de forma uniforme...

Trago a todos um assunto muito instigante. Deparo-me com uma reportagem no jornal, indicando na manchete que o “uso da maconha foi liberado para adultos na Argentina”. Foi ai que ressurgiram muitas ideias, questionamentos, dúvidas sobre o tema. A maconha é uma droga assim como tantas outras, e dentre todas as ditas proibidas, talvez a menos nociva. Tanto preconceito caí sobre a tal droga, embora alguns países estão dando liberdade ao consumo, tudo acontecendo de forma gradual, apenas alguns mais corajosos o fazem.

De drogas no mundo estamos cheios, consumidas por diversos meios, conseguidas através de diversas fontes e utilizadas por um grande número de pessoas. São drogas aceitas pela sociedade, ou algumas cheias de preconceito, cada uma diferente, mas todas com o mesmo propósito. Recuso-me a admitir que concorde com a liberação da maconha, mas não posso fingir contentamento vendo o quão ignorante consegue ser o povo. Uso apenas o exemplo da maconha, pois sei que muitas outras drogas ditas mais “pesadas” não se encaixariam neste contexto; então indo ao que interessa, quantas pessoas fumam cigarro, mesmo com tanto conhecimento sobre o mal que a “chupetinha do capeta” causa? Mas o número de magnatas lucrando é grande, logo poucos ousam contestar. O cigarro é um problema para quem fuma, gera custos ao orçamento público encaminhado à saúde, e nós fumantes passivos? Nem vou citar os prejuízos.

O cigarro é apenas um dos muitos exemplos que poderiam ser citados como “drogas legais”. São inúmeros os produtos que hoje encontramos em prateleiras de mercados que são nocivos a saúde comprovadamente. Onde há dinheiro poucos tem a coragem de contestar, acredito que a maconha é algo muito pequeno perto de tanta coisa que merecia muito mais preconceito. Muita marginalização, envolvimento da mídia e falta de vontade de quem tem o poder. Como já disse recuso-me a admitir que seja a favor da liberação da maconha, mas não era de se pensar quanta coisa mais deveria ser proibida? Talvez sejamos muito pequenos comparados ao que está por trás de toda essa “tramóia”. Mais um desabafo que fica registrado...

20 agosto 2009




Pintura de Jenny Saville



A beleza é um peso para as mulheres. Melhor: a busca da beleza, a obrigação da beleza. Falo da beleza como construção social, como padrões a se seguir, sob o risco de se ver excluída ou menosprezada pela sociedade em volta. Certa vez vi um vídeo (agora não me lembro o nome, nem direção, nem nada) em que uma mulher deixava os pelos de seu rosto (sobrancelha e buço) crescerem. E andava pelas ruas, o vídeo mostrava a reação das pessoas a tal fato. Ela também inquiria as pessoas sobre o espanto que lhes causava. Ao fim ela dizia que fazer isso era um grande ato de rebeldia para uma mulher.

Rebeldia que pouquíssimas, raríssimas têm de desafiar um tabu. Porque realmente é um tabu. Por que apenas as mulheres "obrigatóriamente" se depilam em nossa sociedade? (homens também podem, se quiserem, mas ninguém vai olhar torto se não o fizerem) Eu não tenho essa mesma coragem, o peso do olhar de reprovação é muito grande. Mas confesso que me sinto realmente muito boba, reles seguidora de padrões, estúpida comigo mesma diante de certos procedimentos "embelezadores". Tento diminuí-los ao mínimo possível.

Ser mulher, de acordo com essa perspectiva, é um processo de se negar constantemente. Negar o corpo, negar os pelos, negar o rosto, a cor natural dos cabelos, as unhas, o tempo, as rugas. É gastar tempo e dinheiro que poderiam ser aproveitados com outras coisas de fato mais importantes. Passar por TERRÍVEIS (repito terríveis) dores físicas e psicológicas. Viver da neurose de se adequar a todo custo. Sentir insegurança pelo fato de não estar depilada ou com as unhas feitas. E quando se olha no espelho, quem está lá? Você ou uma boneca? Você ou uma máscara? Você ou a tentativa frustrada de alcançar um ideal estético rígido e cruel?

Um desabafo. Porque ás vezes tudo isso cansa, tudo isso satura e é preciso dizer.

13 agosto 2009

Por Gabriel George


A verdade nua e crua da cultura popular nunca estará estampada em panfletos de turismo. Não quero escrever como um funcionário de uma empresa

de viajens, muito menos comprar a simpatia alheia com frases aveludadas. Tapa com luva de pelica é com as novelas da globo.

Quem diz que gosta de viajar sabe, há um odor muito característico em toda esta cultura: odor humano, suor do trabalho.

Descobri que há muito mais entre o pudor nacionalista de um tocantinense e o nosso dicionário, que meu vão emprego com as palavras pode sonhar...

Há gotas engorduradas dos condimentos de uma cansada cozinheira de acarajé. Há lágrimas de uma viúva frustrada, que sem saber

oferece uma cuia de tacacá ao assassino de seu marido sem saber. Há dramas, entre um prato e outro de vatapá, numa praça

de pagode, que eclodem por entre a fumaça dos cigarros de palha, como balões de festas sobre uma roseira. Uma discução

ébria, um estampido e outro, e a pólvora se faz sentir. Num momento destes, o que Pepe Moreno canta, na alegre "Bar do Risca Faca",

parece então apenas uma triste música de fundo no meio da correria. Enfim, nestas calhas de roda há sangue, sorrisos e choros. Cultura não é somente

mofo e poeira sobre uma edição de Fausto ou entre volumes de barsas, é também uma poça de cerveja quente sob a luz amarelada de uma feira clandestina.

É vivência. Saúde Pública, Poder Público, Segurança Pública, carentes da atenção do Senado como um bebê recém nascido carece do leite materno...

e alguém se ofende por que sou realista! Ossos do ofício? Quem sou eu, não? Sou uma carcaça... Por incrível que pareça, sou nacionalista,

embora meu repúdio com a hipocrisia possa espetar quem prefira tudo por baixo dos panos. E eu sei que muitos gostam da realidade escrachada.

Sob o sol, vemos a compleição viril de um corpo sadio, pisando na areia quente das praias de água doce. Sob a lua, há somente um vulto.

A agilidade deste corpo nativo, incólume em violar certas leis, vigentes apenas no papel, impressiona. Tucuruí é uma

cidade jovem, na flor da idade praticamente. Ainda nova, e bonita, somente sua criação faz mostrar sua verdadeira feiura; aquela feiura que

há no caráter de uma jovem mal educada. Quase uma amazona. Uma feiura sublime, uma beleza insólita, esta cidade é um caldeirão de estereótipos colecionados há poucas décadas. Há desde o sulista, enfático na pronúncia do "r", ao moreno indígena nortista; que tem lá suas histórias surreais sobre Tupâ, Caipora e

bôtos bem afeiçoados e de lábia bacana. O calor tórrido dos trópicos é facilmente sentido por suburbanos como eu, branquelos azedos que andam de havaianas, e costumam ser apelidados de gringos. A criatividade alheia é uma benção, quando há no coração da vítima, de um batismo desses, paz cristâ. Pudera! Estes dias,

vendo um hermano tocantinense se indgnar com minha retórica eu soube: o crime não compensa... Que a sorte do mesmo me poupe de mais estresse, assim

como jagunçus poupam suas balas com encomendas bêbadas. Quero deixar algo claro: sim, quero causar polêmica. Porém, longe de mim exagerar ou omitir! Um ponto meu que seja sempre concluirá uma verdade nua e crua, muito embora

possa ela ser desagradável a alguns. A todos, desejo paz profunda.



10 agosto 2009

Surdos: uma cultura diferente da nossa

Por Priscila Macedo

Gosto quando Lulu Santos diz:

“Não existiria som
Se não houvesse o silêncio,
Não haveria luz
Se não fosse a escuridão
A vida é mesmo assim,
Dia e noite, não e sim...

Cada voz que canta o amor não diz
Tudo o que quer dizer,
Tudo o que cala fala
Mais alto ao coração.
Silenciosamente eu te falo com paixão...

A vida é mesmo assim,
Dia e noite, não e sim...

Eu te amo calado,
Como quem ouve uma sinfonia
De silêncios e de luz.
Nós somos medo e desejo,
Somos feitos de silêncio e som,
Tem certas coisas que eu não sei dizer...”

E é isso... tem certas coisas que eu não sei dizer.

Não sabia. Talvez eu as tenha aprendido com tantas experiências que tenho tido ultimamente.

Sabe, é isso.

Á um tempo conheci o mundo dos Surdos. Confesso que ainda conheço, conhecendo estou. Seria? No início Deus disse haja luz, e num instante entendi. Compreendo desde então que usar as palavras não é mais importante e significativo como eu pensava. Os são? Sim. Mas os gestos, um olhar, uma expressão. Ah! São mais significativos que qualquer palavra ou poema drummondiano. Como? O sendo. Crianças surdas. Como alfabetizá-las? Impossível! Cria piamente. Hoje? Tudo é possível ao que crê. Já dizia Paulo aos Filipenses. É. É possível. E crianças surdas com deficiência mental? É possível. E surdos-cegos, MEU DEUS? É possível. Eles são como nós, como uma nação em meio a outra. São diferentes como qualquer estrangeiro. Então? Falta-lhes o nosso amor. A nossa amizade. Como os vemos? Coitados? Que dó. Que isso. São gente, e como gente precisam de mais gente. Como? Existe a LIBRAS! Se comunicam. Não são palhaços. Não são gênios da mímica, “engraçadinhos”. São gente. Professores, instrutores, artistas e mais um monte! Amo essa gente! Eles precisam dia após dia ganhar o mundo, mas conseguem sozinhos? As vezes sim, as vezes não. Quantos telefonemas para parentes distantes, marcar consultas por 0800s... e mais um monte que já não tive que fazer para ajudar amigos, até desconhecidos? A realidade: não estamos preparados pra tantas diferenças. Erramos? Nem tanto. Há culpados? Creio que não. O governo? Para neh. Sei lá. Inclusão? Que conversa pra boi dormir. Quem inventou isso? Um político? ...

Bom, continuando a questão de Lulu...

“Cada voz que canta o amor não diz
Tudo o que quer dizer,
Tudo o que cala fala
Mais alto ao coração.
Silenciosamente eu te falo com paixão...”

Assim, hoje, encontrei alguém que me completa:

“Não existiria som
Se não houvesse o silêncio,
Não haveria luz
Se não fosse a escuridão
A vida é mesmo assim,
Dia e noite, não e sim...”

Temos vivido bem. Nunca o vi como surdo, como alguém faltando algo. Eu é que sempre senti algo faltando, como a faca e o queijo, a luz e a estrela, o incerto e o perfeito, o branco e o preto. Uma eterna antítese que não sendo paralelas, se encontram sempre, quebrando assim qualquer regra de não e sim, e pode e não pode, e que é certo, e “que estranho” e tal e coisa. Somos assim. Diferentes. Iguais! Vamos dar as mãos? Ops, se for assim, um tem que ficar fora da roda: interpretando!

(Façamos um esforço)

=D


06 agosto 2009

IX Encontro de Culturas em São Jorge


Foram 18 dias no IX encontro de culturas da chapada dos veadeiros, calculo em dias porque é o que manda a regra, mas o tempo em que passei no encontro não se pode medir, nem se pode dizer se foi muito ou se foi pouco.

Muito tempo se considerarmos que 18 dias é a metade de um mês, muito tempo se considerarmos que a maioria dos eventos costuma ter uma semana, ainda mais que o encontro exigia uma vivencia integral de suas atrações.

Pouco tempo se pensar que já estou com saudades, muitíssimo pouco se olhar para trás e ver que foram os 18 dias mais proveitosos do ano até agora. Quando sai de Goiânia, me sentia simplesmente Goiano, por mais que soubesse que sou Brasileiro, por mais que conhecesse geografia e já tivesse visto de tudo um pouco na tv ou no jornal. Eu era apenas minha cultura urbana e o jeito urbano de olhar pra tudo que me é diferente.

Durante o encontro meus pelos arrepiaram, vi a parte mais visceral desse país, vi o povo de diferentes regiões se encontrarem para dançar e tocar. Senti a força dos tambores e a felicidade do maracatu, senti as diferenças, e então meus olhos brilhavam, estava sentindo o que é ser Brasileiro, estava sentindo toda aquela felicidade, toda aquela força ao meu redor.

Já não acreditava que a cultura popular pudesse resistir a globalização, me enganei, fiquei boquiaberto, vi que havia algo ali muito maior do que a simples reprodução de crenças e tradição, algo muito mais forte que reunia todas as pessoas em prol de um objetivo comum. Acredito que esse algo foi a razão de me arrepiar, que me fez sentir uma adrenalina sem igual, vontade de dançar e de não ir embora mais.

Fora o maracatu que já citei, houve diversas outras manifestações como um encontro de capoeira angola, oficinas de batuque, folia de reis, o império dos Kalunga e varias outras coisas, que se eu for falar de todas vou correr o risco de esquecer alguma, e acabar fugindo do meu foco, tamanha era a proporção do evento, alem do que, abaixo fica o link para quem quiser saber dos acontecimentos de forma isolada.

Uma encontro de culturas em especial foi a 3 º Aldeia Multiétnica, que aconteceu durante a primeira semana do evento. Oito tribos indígenas se alojaram na pousada da lua que dispõe de uma ampla área verde e espaços para apresentação das danças e cantos indígenas, a vivência entre as diferentes tribos e os homens brancos permitiu um maior conhecimento mutuo e por conseqüência maior respeito também.

A procura de todos em alcançar um bem comum, que é a preservação, tanto das culturas e tradições quanto do meio ambiente é a maior conquista desse encontro, durante os dias na aldeia e na cidade. Eu que já era totalmente a favor das causas indígenas, dos ex quilombos e de todos aqueles que foram e ainda estão sendo forçados a abdicar do que é seu em detrimento da chamada civilização fiquei ainda mais militante, e já pretendo fazer meu tcc em uma tribo.

Isso tudo que o encontro proporcionou e muito mais é o que nosso país tem para mostrar, é o que de mais valioso nós temos, nossa cultura , nosso povo e nossa terra. Vamos dar importância ao que é nosso, vamos levantar a cabeça e dizer que nós temos história, que nós temos nossa fé a nossa força, porque é muito vergonhoso e até humilhante, contar nos livros uma historia de colonizador, sem batuques e sem tambor.


www.encontrodeculturas.com.br

*Foto por Anna Morais

03 agosto 2009

Por Gabriel George

Quando comecei a ouvir aquele axé percebi pra onde fora transportado. Era início de junho, mas aquele cais parecia estar sob um luar de fevereiro. Todo aquele movimento de uma beirada à outra, de quílômetros de mesas da Skol, do bastante iluminado e insalúbre cais de Tucuruí, me transportara pra essas atmosferas fantasmas do nordeste. Naquele caos carnavalesco, não sei se estava no Hades ou num Elísio, mas estava divertido. Dividindo o porto há um simpático e esguio farol de alvenaria, rodeado de postes e uma ponte, sob a qual fluem as águas do sistema de saneamento, talvez não tão saneadas assim, para o rio. Perambulando, achei a mesa de um antigo amigo de infância daqui e me sentei, olhei pras águas negras do gigante Tocantins, e pensei: "Aquele povo alí, tomando banho... É como se visse gurus no Ganges, dividindo a água com barquinhos de merda". Desde que esta cidade surgiu, dos restos humanos e pétreos da segunda maior Usina HidrElétrica, mal infraestruturada e marginalizada do poder público, água é o que não falta pra todo cidadão, do mendigo ao grande latifundiário. Vendo o fluxo de água constante sob a ponte à distância, e aqueles cubos de gelo, talvez não muito limpos, no meu copo de whisk, lembrei que sobre a água desta cidade não há imposto algum. Que o diga a simpática tia da caixa de gelo; alí havia peso pra me dar dor nas costas por meses. A caixa era enorme e a larga tampa levantava e abaixava frenética, liberando os espolios de Baco. De fato, não há boleto fiscal pra água; não pagamos talvez por morarmos do lado de uma enorme represa. Pelos deuses! Não vou ficar citando o desperdício de água, tão banal nesta cidade, não sou do green peace. Odeio golfinhos. Também não citaria o conluio entre o governo paraense e a UHE, que desfavorece Tucuruí elitizando a vila adjacente à Usina... Onde eu estava? O brilho daquela noite! Amazônica e úmida. Meninas dançando ao rítmo dos orixás rodeavam nossa mesa, todas bronzeadas pelo sol dos trópicos, animadas pelo som dos atabaques. Nesta noite percebi como as divindades africanas permeiam as letras dos axés. Ouvindo os nomes de Oxossi, Obá e Iemanjá, citados nas beiras das matas e praias, senti, como nunca, o caos. A amplitude que vi, de relance, naquele sincretismo religioso e cultural, alí presente; analogias com os panteões gregos e latinos de deuses humanizados; de dramas humanos, em leitos divinos de pura mácula e desejo; imaginando tudo aquilo como uma releitura determinista de Roma eu... Precisei dar um bom gole do velho Escot e pedir um cigarro pra um transeunte. Quem fuma sabe, sempre haverão chatolinos pedindo um pito ou um picado. Mais pessoas chegavam, e a certa altura a vida pululava como num dia quente de feira, só que sob um céu negro de lua cheia. Entre carrinhos de carne no espeto e pipoca, caixas de cerveja, carros de som e dançarinas de carimbó, soube, apesar de tudo, que eu adoro ser brasileiro.