03 agosto 2009

Por Gabriel George

Quando comecei a ouvir aquele axé percebi pra onde fora transportado. Era início de junho, mas aquele cais parecia estar sob um luar de fevereiro. Todo aquele movimento de uma beirada à outra, de quílômetros de mesas da Skol, do bastante iluminado e insalúbre cais de Tucuruí, me transportara pra essas atmosferas fantasmas do nordeste. Naquele caos carnavalesco, não sei se estava no Hades ou num Elísio, mas estava divertido. Dividindo o porto há um simpático e esguio farol de alvenaria, rodeado de postes e uma ponte, sob a qual fluem as águas do sistema de saneamento, talvez não tão saneadas assim, para o rio. Perambulando, achei a mesa de um antigo amigo de infância daqui e me sentei, olhei pras águas negras do gigante Tocantins, e pensei: "Aquele povo alí, tomando banho... É como se visse gurus no Ganges, dividindo a água com barquinhos de merda". Desde que esta cidade surgiu, dos restos humanos e pétreos da segunda maior Usina HidrElétrica, mal infraestruturada e marginalizada do poder público, água é o que não falta pra todo cidadão, do mendigo ao grande latifundiário. Vendo o fluxo de água constante sob a ponte à distância, e aqueles cubos de gelo, talvez não muito limpos, no meu copo de whisk, lembrei que sobre a água desta cidade não há imposto algum. Que o diga a simpática tia da caixa de gelo; alí havia peso pra me dar dor nas costas por meses. A caixa era enorme e a larga tampa levantava e abaixava frenética, liberando os espolios de Baco. De fato, não há boleto fiscal pra água; não pagamos talvez por morarmos do lado de uma enorme represa. Pelos deuses! Não vou ficar citando o desperdício de água, tão banal nesta cidade, não sou do green peace. Odeio golfinhos. Também não citaria o conluio entre o governo paraense e a UHE, que desfavorece Tucuruí elitizando a vila adjacente à Usina... Onde eu estava? O brilho daquela noite! Amazônica e úmida. Meninas dançando ao rítmo dos orixás rodeavam nossa mesa, todas bronzeadas pelo sol dos trópicos, animadas pelo som dos atabaques. Nesta noite percebi como as divindades africanas permeiam as letras dos axés. Ouvindo os nomes de Oxossi, Obá e Iemanjá, citados nas beiras das matas e praias, senti, como nunca, o caos. A amplitude que vi, de relance, naquele sincretismo religioso e cultural, alí presente; analogias com os panteões gregos e latinos de deuses humanizados; de dramas humanos, em leitos divinos de pura mácula e desejo; imaginando tudo aquilo como uma releitura determinista de Roma eu... Precisei dar um bom gole do velho Escot e pedir um cigarro pra um transeunte. Quem fuma sabe, sempre haverão chatolinos pedindo um pito ou um picado. Mais pessoas chegavam, e a certa altura a vida pululava como num dia quente de feira, só que sob um céu negro de lua cheia. Entre carrinhos de carne no espeto e pipoca, caixas de cerveja, carros de som e dançarinas de carimbó, soube, apesar de tudo, que eu adoro ser brasileiro.

10 comentários:

  1. Eu não sei o que é ser brasileira no Pará! Um país tão enorme o nosso! Quem me dera saber as inúmeras formas de se ser brasileira!!

    Belo texto!!! Viajei com ele!!
    =)

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  2. Louco. Sinceramente, amo fazer essas análises nada-a-ver dos momentos... interessante pensar em algo tão sério e uma simples noite de axé e bebidas, e cubos de gelo não muito limpos... e tal! Confesso que sempre que estou em situações inusitadas ou meras situações simples, simples me assusto tbm com tapinhas e : "tah sonhando?"... ... só uma pergunta: tava escrevendo enquanto via a tia do gelo???...o.O'

    (AH, eu curto golfinhos...o/")

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  3. Viajei com ele. Em alguns momentos é um sonho ser brasileiro, embora em outros seja mais parecido com um pesadelo. Muito bom viaja numas descrições, em algumas situações. Texto muito bom. Só tem a acrescentar com suas postagens. x)

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  4. que bom que agradei ^^

    mas exclarecendo: priscila, gosto de golfinhos, mas eles me lembram green peace, e green peace me lembra militantes entusistas demais que acabam sujando a reputação da ong... e consequentemente a reputação do estimado flipper

    capisce?

    um abraço a todos

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  5. "soube apesar de tudo que eu adoro ser Brasileiro" gostei demais dessa última frase
    um sentimento parecido que vivi nós ultimas dias no 9 encontro de culturas tradicionais
    eu vi indio vi atabaques e vi marcatu alem de ver que adoro ser Brasileiro vi que o bom mesmo é o norte e o nordeste
    um povo animadoo e feliz isso é a cara do Brasil x)

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  6. Cara simplesmente horrível e desconecto.... Vc fez uma chuva de clichês, aposto que pegou um dicionário e ficou escolhendo algumas palavras... Olha o que vc disse está mais para qualquer outro lugar... com certeza vc estava muito doido..... mas vale a última parte, adoro ser brasileiro... apesar que tudo que vc disse da uma impressão que vc é um europeu exilado no Brasil.... Por favor amigo olhe o respeito quando fores falar do norte... Pará é norte e não Nordeste. Desculpe as palavras é que vc simplesmente conseguiu ofender qualquer pessoa decente que nao foi criado fechando em apartamento e ainda mais quem conhece ou é da região citada na sua crônica

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  7. tertuliano, o que escrevi é o que eu vi, realmente estou nesta cidade, tucuruí, e se minha maneira de ver as coisas não lhe agrada, o que eu posso fazer?

    é a pura realidade da região

    vc naum pode fazer nada quanto a isso, meu caro, e quando falei do "fantasma do nordeste" é apenas por causa do clima, e da cultura daqui que, REALMENTE, é parecida!

    vc é paraense?

    se te ofendi, bem, vc se ofende muito fácil... "visse?!"

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  8. onde foi que eu errei? no whisk? no cigarro? putz, o que seria esta crítica desconstrutiva, da qual nada posso tirar de proveito pra mim? ou vc estaria tomando as dores da cidade? da tia do gelo... as palavras que usei, não precisei ir a um dicionário... mas se as usei mal, isto sim seria uma crítica construtiva... morei aqui quase toda minha infância, adolescência, e tenho que ouvir que exagerei, e que escrevo como um gringo, como se eu estivesse aqui de passagem por umas semanas... vc não sabe muito o que diz, e de maneira alguma posso axar ruim também, não? vc escreve o qui quiser dos outros, muito embora eu espere qui sua visão de mim tenha mudado, pq se vc fosse passar uma semana aqui, numa fazenda trabalhando num pimental e desgastando suas mãos finas, talvez saberia que só digita asneiras, e qui eu tenho direito de me divertir com o qui eu quiser

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  9. Esse é o risco de tornar público as idéias, textos, produção artística... as críticas sempre virão, não vai ser unanimidade. Mas é um risco que é necessário correr, é preferível esse risco do que guardar tudo. De que valeria a melhor das idéias se ninguém mais tomasse conhecimento? Seria como se nem existisse.
    Em frente, apesar das críticas, afinal cada um tem direito a sua própria visão de mundo!

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  10. gosto de jogar pedras em quem concorda comigo em tudo, em quem só faz acordos sempre por medo das brigas
    a vida é isso é explosão é diferença é conceito e pré-conceito
    x)

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